O envelhecimento é um fenômeno biológico natural, mas muitas pessoas que convivem com os idosos não sabem lidar com esse processo.
Por Regina Beatriz Tavares da Silva*
Para proteger o idoso, inclusive no seio familiar, vigora no Brasil o Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003), em cumprimento ao que dita a Constituição Federal, pela qual a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e seu bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida (art. 230). Segundo a legislação brasileira, idoso é a pessoa que tem idade igual ou superior a 60 anos.
Pode parecer errada a escolha dessa idade para a proteção especial conferida pela lei, já que muitas pessoas de 60 anos ou mais ainda estão ativas na vida pessoal e profissional, não sendo vulneráveis.
Mas, diante da expectativa de vida do brasileiro, que, inobstante esteja subindo nos últimos anos, no ano de 2003, quando foi aprovado o Estatuto do Idoso, era em média de 71,3 anos segundo o IBGE, foi bastante razoável a escolha da idade de 60 anos.
A refletir o aumento na expectativa de vida do brasileiro, neste ano de 2017, pela Lei nº 13.466, foi incluída proteção especial às pessoas com mais de 80 anos, no que se refere às prioridades constantes do art. 3º do Estatuto do Idoso, o que inclui atendimento preferencial imediato e individualizado junto aos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população.
O Estatuto do Idoso prevê que “Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei.”, sendo dever de todos prevenir a ameaça ou violação aos direitos do idoso (art. 4º).
Daí resultam várias disposições legais em proteção do idoso que constam do Estatuto em análise.
Por exemplo, na pensão alimentícia. O dever dos filhos maiores de idade de prover os meios necessários à subsistência dos pais que não têm condições para tanto é previsto no Código Civil. Mas, o Estatuto do Idoso dispõe que “A obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores” (art. 12). Assim, se os pais tiverem mais de 60 anos, poderão escolher o filho de que querem receber a pensão, não sendo necessário demandar todos os filhos numa ação de alimentos, o que facilita o seu recebimento. E esse Estatuto classifica como a recusa a prestação de alimentos destinados a prover as necessidades básicas do idoso (art. 98).
Também deve ser assegurada aos idosos a prioridade na tramitação dos processos judiciais, incluindo atos e diligências judiciais, disposição legal esta que, em meu modo de ver, ainda carece de aplicação eficaz (art. 71).
Considera-se violência contra o idoso qualquer ação ou omissão praticada em local público ou privado que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico (art. 19, §1º).
Assim, as práticas criminosas contra os idosos são classificadas em físicas e psicológicas, mas também são previstas outras condutas criminosas no Estatuto do Idoso, inclusive por violações patrimoniais, entre outras como o abandono. O Estatuto do Idoso tipifica várias condutas contra o idoso como crimes.
Assim, por exemplo, a discriminação contra pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania; o abandono do idoso em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres; a exposição ao perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendo-o a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentação e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado; a negação a alguém, por motivo de idade, de emprego ou trabalho; a apropriação ou desvio de bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa de sua finalidade; a retenção de cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios, proventos ou pensão do idoso, bem como qualquer outro documento com objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida; a exibição ou veiculação, por qualquer meio de comunicação, de informações ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa do idoso; e a coação, de qualquer modo, do idoso a doar, contratar, testar ou outorgar procuração.
O Estatuto do Idoso também determinou que, em se tratando de vítima idosa, não se aplica a isenção de pena prevista ao cônjuge e ao filho na prática de certos crimes, como furto, estelionato e apropriação indébita (art. 95).
Muitas proteções, além daquelas acima referidas, constam do Estatuto do idoso, mas o desafio em todas as legislações é o seu eficaz cumprimento, sendo sempre relevante lembrar que a informação, ainda que em recordação das medidas protetivas, é sempre o melhor meio de proteger.
O idoso deve ser informado e os que o circundam devem também ser lembrados das punições que podem sofrer se não cumprirem a lei.
Já que a maior dificuldade na eficácia da lei é decorrente do fato de que em muitas vezes quem agride o idoso é o próprio cuidador, sendo que o idoso tem medo de denunciá-lo e ficar abandonado, ou até mesmo tem o receio de não ser ouvido, na conformidade do Estatuto do Idoso, “Todo cidadão tem o dever de comunicar à autoridade competente qualquer forma de violação a esta Lei que tenha testemunhado ou de que tenha conhecimento.” (art. 6º), de modo que os casos de suspeita ou confirmação de violência contra os idosos devem ser obrigatoriamente comunicados às autoridades competentes, entre as quais as autoridades policiais, sendo recomendável que a denúncia seja realizada em Delegacias especializadas, chamadas Delegacias dos Idosos, quando houver nas proximidades da prática delituosa, as quais já existem em oito unidades na Capital de São Paulo.
*Presidente da ADFAS (Associação de Direito de Família e das Sucessões). Doutora em Direito pela USP e advogada